Edmonds, juiz
Bibliografia
O LIVRO DOS MÉDIUNS

Segunda edição53

A primeira edição de O Livro dos Médiuns, publicada no início do ano, esgotou-se em poucos meses, o que vem a ser um dos traços mais característicos do progresso das idéias espíritas. Nós mesmos pudemos constatar,  em nossas excursões, a influência salutar que esta obra exerceu sobre a direção dos estudos espíritas práticos; assim, as decepções e mistificações são muito menos numerosas do que outrora, porque ela ensinou os meios de frustrar as artimanhas dos Espíritos enganadores. Esta segunda edição é muito mais completa que a precedente; encerra numerosas e importantes instruções e vários capítulos novos. Toda a parte que concerne mais especialmente aos médiuns, à identidade dos 53 1 vol. in-12, preço 3 fr. 50 c.; pelo Correio, 4 fr. Espíritos, à obsessão, às questões que podem ser dirigidas aos Espíritos, às contradições, aos meios de discernir os Espíritos bons dos maus, à formação de reuniões espíritas, às fraudes em matéria de Espiritismo, recebeu notáveis desenvolvimentos, frutos da experiência. No capítulo das dissertações espíritas adicionamos várias comunicações apócrifas, acompanhadas de observações pertinentes, de modo a facultar os meios de descobrir o embuste dos Espíritos enganadores, que se apresentam com falsos nomes.

Devemos acrescentar que os Espíritos reviram a obra inteiramente e trouxeram numerosas observações do mais alto interesse, de sorte que se pode dizer que é obra deles, tanto quanto nossa.

Recomendamos com insistência esta nova edição,como o guia mais completo, seja para os médiuns, seja para os simples observadores. Podemos afirmar que, seguindo-a pontualmente, evitar-se-ão os escolhos tão numerosos, contra os quais se vão chocar principiantes inexperientes. Depois de a ter lido e meditado atentamente, os que forem enganados ou mistificados certamente não poderão culpar-se senão deles mesmos, porque tiveram todos os meios para se esclarecerem.

O ESPIRITISMO OU ESPIRITUALISMO EM METZ

Primeira série das publicações da Sociedade Espírita de Metz54

Em nosso último número anunciamos esta publicação apenas de memória, propondo-nos a voltar à matéria. Lemo-la com atenção e só podemos felicitar a Sociedade dos espíritas de Metz por seus resultados. Ela conta em seu seio um grande número de homens esclarecidos que, esperamos, saberão mantê-la em guarda contra as ciladas dos Espíritos maus, que não deixarão de tentar desviá-la do bom caminho em que se colocou. 54 Brochura in-8; preço 1 fr. Em Paris: Didier & Cia., Quai des Augustins, 35; Ledoyen, Palais-Royal, galeria d’Orléans, 31. Em Metz: Verronais, rue des Jardins, 14; Warrion, rue du Palais, 8.

Esta publicação não é periódica; a Sociedade de Metz tem o propósito de fazer outras semelhantes de vez em quando, em datas indeterminadas, e nelas inserir as melhores comunicações que tiver obtido. Esse método tem a vantagem de não obrigar a assunção de nenhum compromisso com assinantes, aos quais se deve servir apesar de tudo, e porque os gastos são sempre proporcionais.

Todas as comunicações contidas nesta primeira brochura trazem um sinete eminentemente sério e uma moralidade irrepreensível. Nada notamos que não fosse o que se poderia chamar de ortodoxo, do ponto de vista da Ciência e de acordo com o ensino de O Livro dos Espíritos. Se os senhores espíritas de Metz nos permitem um conselho, nós os estimularíamos a que continuem guardando, em suas publicações subseqüentes, a prudente reserva que notamos nesta; que se convençam de que as publicações intempestivas podem ser mais prejudiciais que úteis à propagação do Espiritismo. Contamos com a sabedoria e a sagacidade dos que as dirigem, para não cederem ao entusiasmo de adeptos mais zelosos que sensatos; que se lembrem bem desta máxima: Não adianta correr; tudo tem sua hora.

As duas comunicações seguintes, extraídas deste primeiro número, podem dar uma idéia do espírito no qual são feitas.

O FLUIDO UNIVERSAL

(29 de setembro de 1860)

O fluido universal liga entre si todos os mundos; e,conforme os movimentos que lhe são impressos pela vontade do Criador, origina todos os fenômenos da Criação. Ele é a própria vida, ligando as diferentes matérias de nosso globo; é ele que, por propriedades subordinadas a leis, regula as diferentes coisas tão misteriosas para vós, as afinidades físicas e morais; é ele que vos faz ver o passado, o presente e o futuro, principalmente quando a matéria que obstrui vossa alma é anulada ou enfraquecida por uma causa qualquer; então essa dupla vista (embora menos desenvolvida do que após a morte), vê, sente e toca tudo, nesse meio fluídico que é o seu elemento e o reflexo exato do que foi, é e será; porque somente as partes mais grosseiras desse fluido estão sujeitas a modificações sensíveis de composição.

Henry, antigo magnetizador

EFEITOS DA PRECE

(15 de outubro de 1860)

A prece é uma aspiração sublime, à qual Deus concedeu um poder tão mágico que os Espíritos a reclamam para si constantemente. Suave orvalho, é um refrigério para o pobre exilado na Terra e um arranjo (sic) frutuoso para a alma em prova. A prece age diretamente sobre o Espírito a quem é dirigida; não transforma espinhos em rosas, mas modifica sua vida de sofrimentos; não tem poder sobre a vontade imutável de Deus, mas imprime esse impulso de vontade que levanta a sua coragem, ao dar-lhe força para lutar contra as provas e as dominar. Por esse meio é abreviado o caminho que conduz a Deus e, como efeito maravilhoso, nada pode ser comparado à prece.

Aquele que blasfema contra a prece não passa de Espírito inferior, de tal modo terreno e atrasado que nem mesmo compreende que deve se agarrar a essa tábua de salvação para se salvar.

Orar: palavra descida do céu, é a gota de orvalho no cálice de uma flor, é o sustentáculo do caniço durante a tormenta, é a tábua do pobre náufrago durante a tempestade, é o abrigo do mendigo e do órfão, é o berço para a criança dormir. Emanação divina, a prece nos liga a Deus pela linguagem, fazendo-o interessar-se por nós; orar a Ele é amá-lo; suplicar-lhe por um irmão é um ato de amor dos mais meritórios. Vinda do coração, a prece contém a chave dos tesouros da graça; é o ecônomo que dispensa benefícios em nome da infinita misericórdia. A alma,elevada para Deus por um desses impulsos sublimes da prece, desprendida de seu envoltório grosseiro, apresenta-se cheia de confiança diante dEle, segura de obter o que pede com humildade. Orai, oh! orai! fazei um reservatório de vossas santas aspirações,que será despejado no dia da justiça. Preparai o celeiro da abundância, tão precioso durante a escassez; escondei o tesouro de vossas preces até o dia escolhido por Deus para distribuir o rico depósito. Acumulai para vós e para os vossos irmãos, o que diminuirá as vossas angústias e vos fará transpor mais rapidamente o espaço que vos separa de Deus. Refleti em vossa miserável natureza, contai vossas decepções, vossos perigos, sondai o abismo tão profundo aonde vos podem arrastar as paixões, olhai em torno de vós os que caem e sentireis a imperiosa necessidade de recorrer à prece. A oração é a âncora de salvação que impedirá a destruição do vosso navio, tão agitado pelas desordens do mundo.

Teu Espírito familiar

O ESPIRITISMO NA AMÉRICA

Fragmentos traduzidos do inglês pela Srta. Clémence Guérin55

O Espiritismo conta na América homens eminentes que, desde o princípio, lhe avaliaram o alcance e nele viram algo mais do que simples manifestações. Nesse número está o juiz Edmonds, de Nova Iorque, cujos escritos sobre esse importante assunto são bastante apreciados, mas muito pouco conhecidos na Europa, onde ainda não foram traduzidos. Devemos ser gratos à Srta. Guérin por nos dar uma idéia deles através de alguns fragmentos publicados em sua brochura. Apenas lamentamos não 55 Brochura grande in-18, preço 1 fr. Dentu, Palais Royal, galeria d’Orléans. tenha ela acabado sua obra por uma tradução completa. Ela junta alguns extratos não menos notáveis do Dr. Hare, de Filadélfia, que, também ele, teve a ousadia de ser um dos primeiros a afirmar sua fé nas novas revelações.

A Srta. Guérin, que residiu muito tempo na América,onde viu se produzirem e se desenvolverem as primeiras manifestações, é uma dessas espíritas sinceras, conscienciosas, que tudo julgam com calma, sangue-frio e sem entusiasmo. Temos a honra de conhecê-la pessoalmente e nos sentimos felizes por lhe dar aqui um testemunho merecido de nossa profunda estima. Pelo seguinte trecho de sua introdução, pode-se ver que nossa opinião é justamente motivada.

“Como os americanos, temos a Fé profunda, a esperança radiosa de que esta doutrina, tão eminentemente baseada na caridade – não esmola, mas amor – seja bem aquela que deve regenerar e pacificar o mundo. Jamais a solidariedade fraternal foi demonstrada de maneira mais clara, nem de modo mais sedutor. Vindo consolar-nos, ajudar-nos, instruir-nos, indicar-nos, enfim, o melhor uso a ser feito de nossas faculdades, tendo em vista o futuro, os Espíritos são de tal modo desinteressados que o homem não os pode ouvir muito tempo sem experimentar o desejo de os imitar, sem procurar ao seu redor alguém para participar dos benefícios que lhe dispensaram tão generosamente. Ele o faz com tanto mais boa vontade quanto compreende que seu próprio progresso tem esse preço e que, no grande livro de Deus, não são levados a seu favor senão os atos praticados em vista do bem-estar material ou moral de seus irmãos. O que os Espíritos fazem com sucesso neste momento foi tentado muitas vezes na Terra por nobres corações, por almas corajosas, que foram e ainda são desconhecidos e ridicularizados. Suspeitam de seu devotamento e não é senão quando desaparecem que têm chance de ser julgados com imparcialidade. Eis por que Deus lhes permite continuar a obra após aquilo a que chamamos morte.

“Não é o caso de repetir com Davis: Nada temais,irmãos; sendo mortal, o erro não pode viver; sendo imortal, a verdade não pode morrer!”

Clémence Guérin

A passagem seguinte, do juiz Edmonds, mostrará com que precisão ele entrevira as conseqüências do Espiritismo. Não se deve esquecer que escrevia em 1854, época em que o Espiritismo na América, como na Europa, ainda era novo.

“Falsas ou verdadeiras, outros julgarão as minhas deduções. Meu objetivo será atingido se, falando do efeito produzido em meu espírito por essas revelações, eu tiver feito brotar em alguns o desejo de também pesquisar e assim levar novas luzes ao estudo desses fenômenos. Até aqui, os mais impetuosos adversários, os que, na sua indignação, gritam contra a impostura, são também os mais obstinados na sua recusa de nada ver ou ouvir sobre isto, os mais decididos a permanecer na completa ignorância da natureza dos fatos. Homens com reputação de saber, se não de ciência, não temem comprometê-la dando explicações que não satisfazem a ninguém, baseadas em observações superficiais, feitas com tal leviandade que faria corar um estudante.

“Entretanto, não é uma coisa indiferente esse novo poder inerente ao homem (connected with man), e que, sem a menor dúvida, terá sobre o seu destino uma influência considerável, para o bem ou para o mal.

“E já podemos ver que, desde a origem, apenas há cinco anos, a idéia espiritualista se propagou com uma rapidez que a igreja cristã não havia igualado em cem anos. Ela não procura os lugares isolados, não se envolve em mistérios, mas vem abertamente aos homens, provocando minucioso exame de sua parte, não exigindo uma fé cega, mas recomendando, em todas as circunstâncias, o exercício da razão e da livre apreciação.

“Vimos que as zombarias dos filósofos não conseguiram desviar um só crente; que os sarcasmos da imprensa, os anátemas do púlpito são igualmente impotentes para deter o progresso e, sobretudo, já podemos constatar sua influência moralizadora. O verdadeiro crente torna-se sempre mais prudente e melhor (a wiser and a better man), porque lhe foi demonstrado que a sobrevivência do homem após a morte do corpo está positivamente provada. Todos quantos, seriamente e com sinceridade, conduziram suas investigações sobre o assunto,tiveram suas provas irrefutáveis. Como poderia ser de outro modo? Eis uma inteligência que nos fala todos os dias; é um amigo. (Em geral os americanos começam conversando com parentes ou amigos). Ele prova a sua identidade por mil circunstâncias que não podem deixar a menor dúvida, pelas numerosas recordações que só ele pode conhecer. Fala-nos das conseqüências da vida terrena e nos pinta a vida futura em cores tão racionais que nós sentimos que diz a verdade, tanto se conforma com a idéia íntima que fazíamos da Divindade e dos deveres que ela nos impõe.

“A morte não nos separa daqueles a quem amamos. Muitas vezes eles estão junto de nós, ajudam-nos e nos consolam pela esperança de uma reunião certa. Quantas vezes os vi para mim e para os outros! Quantas pessoas desoladas vi acalmadas pela doce certeza de que o ser querido, ‘trazido pelos laços do amor, adeja em torno delas, murmura-lhes ao ouvido, contempla a sua alma,conversa com seu Espírito!’

“Assim, a morte se acha despojada do cortejo de terrores misteriosos e indefinidos com que foi cercada por aqueles que confiam mais na degradante paixão do medo que no nobre sentimento do amor.

“Notemos, por alto que, sejam quais forem os matizes no ensino da nova filosofia, todos os seus discípulos se entendem sobre este ponto: a morte não é um espantalho, mas um fenômeno natural, de passagem a uma existência em que, livre de mil males da vida material e dos entraves que o confinam num mesmo planeta,o Espírito pode percorrer a imensidade dos mundos, levantar vôo para regiões onde a glória de Deus é realmente visível.

“Está igualmente demonstrado (demonstrated) que os nossos mais secretos pensamentos são conhecidos pelos seres que nos amaram e que continuam a velar por nós. É em vão que tentaríamos nos livrar dessa inquisição, terrível por sua própria benevolência. Não é possível duvidar, como quiseram. Muitas vezes fiquei estupefato e me arrepiei ante a revelação imprevista, mas irrecusável, de que os mais íntimos refolhos da consciência podem ser revistados justamente por aqueles a quem quereríamos ocultar nossas fraquezas.

“Não está aí um freio salutar contra os maus pensamentos, os atos criminosos, na maioria das vezes cometidos porque o culpado se tranqüilizou por estas palavras: ‘Ninguém ficará sabendo...’ Se algo pode confirmar esta verdade tão terrificante para alguns, é a lembrança do que cada um experimenta após uma boa ação, mesmo quando ficou secreta: um contentamento íntimo incomparável. Esses o sabem muito bem,pois a mão esquerda ignora o que dá a direita. É, pois, racional, crer que se nossos amigos nos podem felicitar, também nos podem admoestar; se vêem nossos atos meritórios, igualmente percebem os nossos defeitos.

“A isto não hesitamos em atribuir o fato incontestável e inconteste, de que não há verdadeiro crente que não se tenha tornado melhor.

“De nossa conduta, de nossa submissão a este grande preceito: Amar a Deus e ao próximo... depende o nosso destino futuro, e não de nossa adesão a esta ou àquela seita religiosa. Não devemos postergar a nossa conversão e sim trabalhar, nós mesmos, pela nossa salvação, agora, e não mais tarde, hoje, e não amanhã.

“Que haverá de mais consolador, mais reconfortante para a alma virtuosa, através das provas e vicissitudes desta vida, do que a certeza completa de que sua felicidade futura depende de suas ações, que ela pode dirigir?

“Por outro lado o vicioso, o mau, o cruel, o egoísta,sobretudo o egoísta, sofrerá por si e pelos outros (self and mutual torment) tormentos mais terríveis que os do inferno material, tal qual a imaginação mais desordenada jamais pôde conceber.”

Allan Kardec

R.E. , novembro de 1861, p. 517